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segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A mobilidade criminal e as Cartas de Controle

Florianópolis, 03-06-2009

Tenente-coronel Eron Barbi (*)



O crime como fenômeno sociológico é comunitário, assume feições diferenciadas apresentando idiossincrasias dentro do ambiente em que está inserido, pode-se comprovar facilmente tais observações analisando a distribuição espacial temporal dos delitos em nossas comunidades, em nível de bairro, por exemplo.

Porém o crescimento urbano acelerado e mal planejado, não leva em consideração os aspectos da arquitetura em relação à prevenção criminal, há uma falta de uma visão proativa fundamentada na análise da causa como forma de anular o efeito. Isto provoca um descontrole na criminalidade. Tudo isso sem mencionar a correta distribuição do nosso aparato policial, algumas vezes feito de maneira desordenada, sem visão clara de objetivos onde realmente queremos chegar. Ou seja, dentro de parametros técnicos, adequados fundamentados na informação, inteligência convergindo para o uso da telematica como ferramenta de apoio.

A sociedade onde estamos imersos é uma máquina defeituosa que está constamente produzindo – ou melhor dizendo – gerando peças fora do padrão que chamaremos de crime. Estas peças rompem as faixas de tolerância por falta de mecanismos de controle os quais efetivamente cumpram seus objetivos. A criminalidade que hoje convive conosco é um produto que precisa ser controlado, mensurado, pois é um processo contínuo que sofre variação.

Nenhuma pessoa é igual à outra, mesmo que duas pessoas se pareçam muito do ponto de vista físico, logo perceberemos suas diferenças, inclusive e principalmente psicológicas.

É necessário, imperativo e urgente aprender a identificar as variabilidades, buscar suas causas, e tomar as devidas ações corretivas. Temos que começar a entender que a “variação” nos diz sempre algo a respeito de um processo. Quando a variabilidade passa a ser reduzida os processos são melhorados, todavia esta variação deve tender a alcançar um patamar de estabilidade, que infelizmente ainda não temos, pois não medimos os processos como deveríamos. Nossos indicadores não são indicadores de processo que mensuram processos de melhoria continua.

Quando um sinal de instabilidade se manifesta em um sistema, é um forte indicador que algo errado está ocorrendo neste sistema. Existe alguma anomalia presente, não raras vezes esta anomalia está arraigada nos métodos, crenças e comportamentos das pessoas que fazem parte do processo. Falta qualidade na resposta final ao usuário do sistema.

O crime é um vírus mutante, peça defeituosa de uma máquina doente, por isso temos que assumir que esta peça precisa ter sua faixa de tolerância diminuída e, em segundo plano, compreender mais profundamente as causas dos defeitos. Muitas vezes acreditamos que esses defeitos são inevitáveis, mas se assimilarmos o crime como um defeito da máquina ‘sociedade’ podemos entender que os defeitos podem ser reduzidos. Kume (1993) afirma: “os defeitos são causados por variações, se estas forem diminuídas, elas certamente diminuirão .”

Com base no trabalho na Bell laboratories no começo dos anos 1920, o Dr Shewhart ( 1992) analisou a variabilidade como sendo fruto de duas possibilidades:

 Aquela que ocorre dentro dos limites definidos pelo acaso, aleatóriamente e;

 Aquela que está fora destes limites.

Estando fora destes limites, ele acreditava que as causas poderiam ser identificadas. Deming (1990)

Para medir estas variações são usadas as Cartas de Controle, que separam as causas comuns das causas especiais. A partir de uma média do processo são estabelecidos dois limites: um superior, e um inferior. Eles podem ser definidos pelo operador do sistema de segurança pública por 1, 2 ou 3DP (Desvio Padrão). Em relação à média, quanto menor for o desvio padrão, menor a faixa de variação do processo e, por conseqüência, terá um maior controle sobre a evolução temporal das ocorrências criminais.

Os valores acima do limite superior devem ser investigados pelo analista criminal. Questões como hora, local, tempo, arquitetura local, tipo do policiamento, características (físicas e psicológicas) dos agentes, modus operandis, dentre outros, devem ser avaliados e assinalados.

O objetivo das Cartas de Controle é manter os crimes dentro de uma faixa de tolerância estável, controlada. Por exemplo elas podem ser usadas em nível de bairro ou município. Obviamente teremos faixas distintas para cada região analisada, em função do crime não estar numa perspectiva primária, não adquirir o perfil da ogiva de Galton do ponto de vista estatístico.

Deve ser buscada uma continua melhoria do processo no âmbito do sistema criminal onde os delitos fiquem estáveis, com uma baixa entropia. Estamos imersos em um mundo variável, ver a criminalidade de forma geral como um processo muda a ótica de “fazer polícia”. Abandonamos de forma pragmática a idéia de acabar com a criminalidade e abraçamos a via do controle da criminalidade através do uso de ferramentas e técnicas modernas no nível do gerenciamento estratégico , tático e administrativo.

Contudo se deixarmos que a entropia do sistema aumente, fugindo completamente do controle das agencias de defesa social, estaremos inexoravelmente caminhando a passos largos para o caos.

* Tenente-coronel Eron Barbi, analista criminal, é subchefe da Agência Central de Inteligência da Polícia Militar de Santa Catarina.

Disponível em:
http://www.pm.sc.gov.br/website/redir.php?act=1&id=5387

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